O Puer Aeternus

O Puer Aeternus: sua Luz e Sombra, Encanto e Tragédia

O Puer Aeternus: sua Luz e Sombra, Encanto e Tragédia

O puer aeternus é uma imagem arquetípica que exerce um grande fascínio sobre todos nós. De um jeito ou de outro…

Onde há aspiração espiritual, liberação do espírito, liberdade, entusiasmo, o puer está lá!

E como todo arquétipo, ele tem luz e sombra.

Nesse artigo, eu exploro esse personagem fascinante, e trago uma visão histórica do mito, as suas formas de atuar na psique e nos relacionamentos.

Leia com atenção e você terá valiosos insights e fará correlações importantes na sua vida e nos seus relacionamentos.

Principais Tópicos desse Artigo (clique na seta ao lado para abrir o menu)

A Imagem Mítica

É natural que encontremos o puer mais ativo em ambientes que envolvam programas de autodesenvolvimento do que em palestras de estatística e administração.

A sua imagem personifica ideias e potenciais novos que estão emergindo no inconsciente coletivo

Qualquer coisa que se relacione com liberação do espírito e da mente pertence aos seus domínios.

O puer aeternus é a imagem de um impulso universal, e não apenas da natureza humana, mas também da própria vida, que aponta para o reino espiritual.

Naturalmente ele é encontrado nos mitos, nos contos de fada e nas lendas de cada nação. Assim como ele também é visto nos sonhos e nas fantasias dos indivíduos.

Mãe Terra e o Pai do Céu

Nós seres humanos projetamos os nossos instintos em figuras divinas.

Isso porque os instintos tem um poder tremendo e estão além da vontade consciente.

Imagens míticas como o Pai do Céu – presente em muitas tradições e em especial no cristianismo e a Mãe Terra – presente nas culturas mais conectadas com as forças naturais.

Essas são imagens ou padrões inerentes à vida que sentimos como divinos porque elas são poderosas e universais.

Uma imagem arquetípica é um retrato subjetivo que a psique faz de como ela sente esses padrões inatos.

E assim essas imagens contém uma conotação sentimental e um sistema de valor para nós.

Instinto Espiritual

Quando consideramos o puer, uma das coisas que estamos olhando é a imagem que envolve um instinto espiritual.

O puer aeternus está associado à aspiração pela vida eterna: a experiência do espírito que elevará o homem acima da morte, da corrupção, da escravidão em relação à hereditariedade e ao destino.

São os poderes espirituais transcendentes do inconsciente coletivo.

O puer é o símbolo de alguma coisa inata em todos nós. Ele é uma dimensão do inconsciente coletivo, e não só um padrão psicológico de uma determinada pessoa.

Os dominantes arquetípicos como o puer são mais ativos em alguns indivíduos do que em outros. E isso não acontece somente por causa do ambiente, da influência paterna ou às atitudes culturais.

O Espírito Eterno

Espírito é uma dessas palavras – da mesma forma que a palavra amor – que significa diversas coisas dependendo da pessoa.

A palavra espírito aqui usada para descrever o puer aeternus, é associada a uma experiência de eternidade e de imortalidade: algo que não envelhece e não morre, diferente do que acontece com o corpo.

Uma das características míticas mais frequentes é a de que ele é imortal, uma criança divina. E no caso de morrer, ele será ressuscitado.

O puer está no centro das religiões que se ocupam com o relacionamento com um espírito eterno.

Aqui nos deparamos com a figura do redentor, daquele que traz a mensagem da libertação dos vínculos mundanos, do pecado e da morte.

Isso fica evidente quando olhamos para o motivo central do cristianismo.

O Puer: redentor, vítima e mensageiro

O início da Era Cristã

No início da era cristã, foi a mensagem do Puer Aeternus que atravessou o inconsciente coletivo com tal força que podemos perceber como o dominante arquetípico pode transformar uma sociedade inteira.

A receptividade com que o inconsciente coletivo da época acolheu essa mensagem foi o que assegurou que ela criasse raízes.

E assim, a figura mítica ou arquetípica se entrelaçou com o caminho da figura histórica, e isso resultou numa nova religião cujo centro é um homem metade humano (sua mãe é terrena) e metade divino (filho do Pai do Céu).

O puer como um intermediário divino

O puer mitológico é o filho de Deus.

Foi enviado dos céus para trazer a mensagem do espírito. Ele é o mensageiro divino.

Ele é uma imagem do nosso anseio e potencial humano pela experiência do significado e da imortalidade, a garantia de que a vida não é mera existência biológica destituída de propósito.

Nesse sentido, ele está ligado à figura astrológica e mítica de Hermes-Mercúrio, que foi o mensageiro entre o mundo olímpico de Zeus, o pai dos Céus, e o mundo material da encarnação.

Foi Hermes viajou para o submundo e guiou as almas dos mortos. Essa é a expressão de Hermes como o guia da almas – função análoga da mente num processo terapêutico profundo.

Hermes (Mercúrio na astrologia) é um dos personagens míticos ligado aos dominantes arquetípicos do puer na personalidade humana.

A criança divina

A experiência de potenciais ilimitados não desenvolvidos pertence ao puer.

A criança divina é outra dimensão do puer aeternus.

A criança encarna potenciais que ainda não chegaram a amadurecer e que, portanto, independem de tempo e espaço.

É a energia que personifica a explosão de entusiasmo, de excitação e de visão ilimitada que sentimos antes que alguma coisa seja fundada e sujeita aos limites da forma.

Atingimos então as alturas. Assim, o puer encarna um senso de infinitas possibilidades.

Essa é a origem da imagem da criança divina.

A manifestação do puer no comportamento e na vida de indivíduo será visto abaixo no artigo.

A ligação de duas figuras míticas: o Puer e Eros

Eros aparece tanto como um garotinho de asas e bumbum de fora atirando flechas amorosas para os mortais se apaixonarem como também aparece como o tremendo poder mantém o universo unido.

No puer, e quando eu chegar no comportamento humano isso fica muito rico para compreender muita coisa, isso se expressa de duas formas:

  • Uma despretensiosa, praticamente tola e ligeiramente maliciosa e
  • Uma outra majestosa, sagrada, encarnada na busca ardente do amor e da união com o divino.

 

Figuras literárias como o incorrigível conquistador de mulheres Don Juan, que tem relevância para o puer.

Isso porque embora Don Juan e os personagens que seguem o mesmo comportamento persigam o prazer físico, estão sendo impulsionados pela busca de um grande amor.

Questão é que a natureza desse amor não pode ser encontrada no corpo.

O comportamento donjuanesco Don Juan é, sem nenhuma dúvida erótico porque ele está em busca de relacionamentos e porque as mulheres amam o romance.

As coisas ficam muito mais claras quando entendemos que na verdade, o puer não está à procura de sexo.

Ele encarna um tipo de anseio mágico.

Trata-se de fato de um anseio místico, que com MUITA frequência se expressa por uma procura romântica de alguém (ou algo) que dará significado à vida.

Autores medievais como São João da Cruz ou Santa Tereza de Ávila, viveram numa época em que o desejo sexual era considerado pecaminoso e o desejo espiritual sagrado.

Para eles, a linha que separa a fantasia erótica da aspiração espiritual é nebulosa.

Robert Johnson descreve em seu livro The Psychology of Romantic Love a semelhança entre “morte de amor” com a experiência mística de pico.

O Puer Aeternus

A Patologia e a Criatividade

No livro The Puer Aeternus, Marie-Louise von Franz fala do puer ligado à mãe e que nunca cresceu o suficiente.

O puer no comportamento aqui é ligado à uma fantasia incestuosa inconsciente que se manifesta através dos vínculos do medo e da fascinação.

Para ela, o Puer parece ser a imagem de um determinado tipo de complexo.

O livro fala sobre a patologia do puer e sobre os tipos de problemas que ele cria quando domina a psique de um homem.

Aqui, o Puer aparece como o mítico filho-amante e representa um estado de psicologia adolescente.

Sobre a patologia do Puer, um livro que fez um tremendo sucesso nos anos 80 foi Síndrome de Peter Pan, do Dan Kiley.

Dan Kiley explora os traços de imaturidade emocional, narcisismo e desespero que giram em torno do que ele cunhou como Síndrome de Peter Pan.

Por outro lado, James Hillman, fundador da psicologia arquetípica pós junguiana, traz perspectivas diferentes.

Para ele, o puer é o filho de Deus, o Pai, cuja relação mais importante é entre o filho e o pai: entre o puer e o senex.

Hillman se ocupa mais do pano de fundo arquetípico dessa dinâmica e com os aspectos criativos do puer.

Para mim, ambos os pontos de vista são importantes:

O puer aparece na vida através de perspectivas e possibilidades criativa e positiva e também é a causa uma grandes problemas e sofrimento no íntimo de um indivíduo e na vida das pessoas que ele se relaciona.

O seu relacionamento ambivalente com o feminino é digno de atenção para a patologia e o lado sombrio de sua natureza.

O mundo do puer é um mundo masculino, embora o que ele busque pareça estar inevitavelmente no abraço das mulheres.

No nível da personalidade

No nível da personalidade, ele pode manifestar algumas qualidades extremamente desagradáveis: imaturidade, exigências infantis, brutalidade, completa ausência de sentimentos e até mesmo crueldade.

Facilita a solução quando compreendemos que essa dimensão mais patológica do puer deve ser considerada lado a lado com o seu significado central: o anseio pela redenção espiritual.

O puer é uma figura interior tanto para o homem como para a mulher, e se contrapõe ao mundo maternal de conceber e de criar filhos.

Pai e Filho: o eixo Puer Aeternus-Senex

O puer nunca entra no palco sozinho. Ele é o redentor, lembra?

A ação da história que está ligada ao mundo que ele luta para transcender – o reino físico da mãe – e ao mundo que ele está tentando alcançar: o espírito eterno do pai.

Como isso se dá na vida de uma pessoa que encarna fortemente o arquétipo do puer?

Aqui é ESSENCIAL olhar a dinâmica desse indivíduo puer com a mãe e a sua relação com o pai.

Os 3 são importantes nessa dinâmica.

Num mapa astrológico, onde esse arquétipo estiver enfatizado, os dois outros – o pai e a mãe – também estarão enfatizados, porque todos os três vem juntos e elaboram a história.

O relacionamento do espírito jovem e rebelde com o mundo estruturado com as suas leis são dois lados da mesma realidade.

Puer e Senex são presentes na nossa experiência humana e representam o novo X o velho, do futuro X passado.

Sem a dimensão prática e madura do pai, que está encarnada na figura do senex, o puer não pode ser efetivamente criativo.

Quando isso acontece nessa triangulação, o puer degenera na figura do “filhinho da mamãe”.

O puer forma uma polaridade com a mãe, da mesma forma que polariza com o senex

No relacionamento com a mãe, o tema “espírito X instinto” é presente.

Nessa dinâmica, a mãe é controladora e possessiva no que se refere ao puer e tenta amarrá-lo a ela e mante-lo dependente.

Isso porque o filho é uma extensão dela, na sua perspectiva.

Nesse caso, a mãe se coloca entre o puer e o senex, pois se esses dois se reconciliarem, ela irá perde-lo.

Essa é uma dinâmica que se repete em muitas famílias e é muito visível nas Constelações Familiares.

Há uma tremenda atração entre o puer e a mãe.

Nela, a mãe ressentida contra o marido se apropria do filho e o torna uma propriedade sua, interpondo-se entre ele e o pai, até o filho acreditar que o pai é tão mal quanto a mãe ensinou.

O puer representa os potenciais de uma vida criativa. E ele fertiliza a mãe, que pode viver o seu espírito através do filho.

O filho é o redentor.

Em troca, a mãe representa para o filho as raízes e a encarnação, o prazer no corpo (muitas vezes na forma de dinheiro para o puer adulto que não consegue se firmar no mundo).

Ela lhe oferece ajuda para que ele manifeste o seu potencial.

Mas o que ele realmente precisa é de um pai.

A mãe é mais poderosa que ele, pois lhe deu a vida, assim como a Grande Mãe irá reclamar o seu corpo na morte.

Até que o puer possa encarnar algo da força e da auto suficiência presentes na força do pai, ele sempre será impotente diante do poder da mãe.

E este é o motivo pelo qual ele tenta perpetuamente libertar-se da sua atração.

Por trás de cada mãe dominadora, existe um filho dependente.

E isso é parte da tragédia de uma vida desperdiçada pelo puer.

A mãe seduz o puer através dos sentidos e através da necessidade que ele sente por ela.

Mas esse é um relacionamento terrivelmente ambivalente, que pode tornar-se muito destrutivo.

O puer precisa estar a par dos negócios do pai.

Ele não pode estabelecer um verdadeiro relacionamento com o reino feminino sem o sentido da potência viril, porque, de outro modo, o feminino sempre lhe parecerá uma mãe poderosa e ameaçadora.

Histórias de Vida diferentes

Acredito que cada pessoa precisa explorar diferentes facetas dessa história triangular.

Para alguns, o problema de serem dependentes da mãe tem de ser enfrentado antes que haja qualquer reconciliação com o pai.

Para outros, o problema de relacionar-se com o pai precisa ser enfrentado antes que possa haver qualquer reconciliação com a mãe.

A Grande Mãe é uma imagem da vida instintiva, coletiva e compulsiva, que naturalmente se ressente com a evolução exigida pelo espírito.

Os instintos são muito conservadores. Eles não mudaram em alguns bilhões de anos.

Quando consideramos o tema do redentor na sua totalidade, que é o papel essencial do puer, o confronto com os instintos é que entra em cena.

Esse é o significado do espírito evolucionário do homem, que lentamente, através dos milênios, cria a vida consciente a partir da inconsciência instintiva cega.

Para isso, a iniciação no mundo do senex, que é bastante realista e sabe o que tem que ser feito, é o que torna o potencial do puer visível.

No processo terapêutico

Num processo terapêutico, iluminar o puer aeternus não é o verdadeiro objetivo.

É preciso adquirir uma sensação de onde e como essas 3 figuras se movem na psique do indivíduo e que tipo de drama elas criam.

Investigar onde ficam os bloqueios que tornam as suas relações impossíveis, e se possível, qual seria uma maneira mais criativa de abordar essa constelação, invés de se identificar cegamente com um desses personagens em particular.

 O espírito revolucionário, dirigido contra o senex projetado na sociedade, é uma manifestação coletiva do puer.

O que muitas vezes o puer deixa de ver é que a liberdade e o êxtase que ele almeja (presentes na figura mítica do pai celestial) e o pai terreno, com suas falhas como qualquer ser humano, são parte essencial da mesma figura arquetípica.

Ele perde a consciência que esse reflexo negativo fica no seu próprio interior!

Num mapa natal, o tema do puer algumas vezes está ligado a um problema claramente marcado com a mãe.

Em outros, o problema é claramente delineado em torno do pai.

A polaridade do Ego Consciente e o Caos criativo do Inconsciente

Na psique, o puer e o senex personificam a polaridade do ego consciente com a sua estrutura e controle e o caótico mundo criativo do inconsciente.

O ego, de muitos modos, é saturnino.

Freud sabia disso quando escreveu sobre a posição naturalmente defensiva do ego.

Além de ser solar e portadora da luz, a consciência também pode ser tirânica e repressora:

Por esse motivo que pode ser tão difícil trabalhar com os produtos do inconsciente e seus sonhos, fantasias e afetos intensos, sem tentar muda-los e “consertá-los” com as ideias que temos de como deve ser uma pessoa saudável.

O ego lutou arduamente pela sua precária existência, para desenvolver esse algo que chama de “eu”.

É natural que ele lute para manter o que conquistou.

Essa é a dimensão saturnina do ego, que construiu o seu senso de identidade, através de uma longa luta, até sair da infância, através das separações, perdas, adaptações e compromissos com a vida exterior.

O puer é um inimigo dessa dimensão saturnina do ego, porque ele personifica o fluxo e a mudança, o poder destruidor e regenerador do inconsciente.

O inconsciente detém o poder de facilmente anular todo o trabalho árduo anterior, e iniciar uma nova direção na vida.

Como diz a música Aquarela:

“E o futuro, é uma astronave que tentamos pilotar. Não tem tempo, nem piedade, nem tem hora de chegar.

Sem pedir licença, muda a nossa vida e depois convida a rir ou chorar…”

A importância de olhar para as polaridades

A vida se manifesta através das polaridades. Para muitas pessoas, é difícil pensar duplamente desse modo, mas se quisermos compreender a psique e a nossa condição humana, precisamos aprender a perceber os opostos.

Sem isso, a abordagem terapêutica torna-se estéril.

Por exemplo: quando vemos a aproximação de um trânsito de Saturno, a interpretação habitual é a de que ele significa um período de restrição, de trabalho árduo, de depressão, de retraimento, e talvez a satisfação de uma conquista em termos mundanos.

Mas isso nunca é tão simples, porque Saturno significa o senex, então podemos colocar-nos num estado mental mais maduro e nos abrirmos para um rico aprendizado.

A questão que torna os trânsitos de Saturno tão penosos é que ambos, o senex e o puer são constelados de uma só vez.

Então apresentam-se períodos em que precisamos esperar com paciência, esforçando-nos sem nenhuma percepção imediata de progresso, aprendendo a lidar com a solidão e com auto suficiência.

Até aí, tudo certo.

Só que por outro lado, essa mesma pressão provoca uma aflição desesperadora: o puer sente-se sufocado e aprisionado!

É por isso que os trânsitos de Saturno não são apenas trabalho árduo, eles também são uma colisão de opostos que agita as nossas almas.

Se tivermos sabedoria e auto honestidade, são essas ocasiões que podemos obter um vislumbre mais profundo das nossas próprias contradições e complexidades.

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